O que ninguém escutou
Eu lembro da sensação de estar em um buraco muito profundo, onde caí de repente e ninguém podia me ouvir, ninguém conseguia me ouvir. E quanto mais eu gritava, mais eco fazia, mas sem reposta. Talvez porque eu não conseguia exprimir em palavras o que estava sentindo, ou talvez porque essas palavras não podiam ser entendidas por quem estava ao meu redor, mesmo que bem ditas. Nesse buraco tinha um choro bem perto, que eu não queria ouvir, eu sabia que alguém precisava de mim, mas como eu podia ajudar se eu estava presa la no fundo?
Meus seios doíam, quase que empedrando, e cada toque era uma ida ao céu, não no bom sentido, era dor, eu sozinha não dava conta de esvaziar o que deveria ser sugado, e cada vez que isso acontecia as paredes do buraco pareciam subir. As pessoas tentavam me ajudar, mas ninguém ouvia, ninguém podia. Para falar a verdade eu nem as queria lá, proibí as visitas, eu sei que a bebezinha era linda, eu deveria soltar fogos de felicidade, mas eu não queria que me vissem no fundo do buraco, porque provavelmente eu estaria chorando deitada, e assim eu os receberia, talvez eu sentasse. Alguém me disse que não queria filhos no momento, e eu disse que não quisesse mesmo, afinal não era lá que eu queria estar, ela também não deveria.
O estômago parecia sempre cheio, mas não tinha comida, por 15 dias nesse buraco eu não comi, as pessoas jogavam para mim, mas a fome não vinha, eu só pensava em sair. Até que em um momento de luz alguém ouviu o que eu não disse: "Stefânia, tem certeza que isso é só por causa da amamentação?". Eu não tinha, mas ela estava certa, não era. Outra voz disse "levante, a gente não consegue, você precisa se ajudar", e eu levantei, quase que sem forças, mas com ajuda de uma escada levantei. Degrau por degrau, passo por passo. Não sei se o fim do buraco já chegou, algumas coisas ainda me prendem, mas continuo andando, tropeçando, mas andando.
Stefânia Acioli
@tevejomae
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